Em Hidrolândia, a 36 quilômetros de Goiânia, o Grupo Marajoara lança o projeto de fertirrigação, iniciativa pioneira que irá beneficiar a pecuária, cuja produtividade cai com a seca.
Um projeto inovador de fertirrigação, que poderá servir de modelo para indústrias e a pecuária goiana, começa a funcionar neste mês de março na cidade de Hidrolândia, a 36 quilômetros de Goiânia. A Marajoara Alimentos irá direcionar a água tratada de sua Estação de Tratamento de Resíduos (ETE) para um pasto de aproximadamente 14 hectares, vizinho à indústria.
O projeto piloto é uma iniciativa de sustentabilidade da indústria que, com a iniciativa, atinge a marca de aproveitar 100% de seus resíduos e desenvolverá um protótipo de eficiência para a pecuária, uma das principais âncoras da economia goiana. Goiás é o segundo maior produtor de gado, com 22,8 milhões de cabeças de gado, segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
“O nosso sistema de tratamento da água por flotação assegura uma eficiência superior a 90%, bem mais do que os 60% exigidos pela legislação ambiental. Até então, ela era lançada no Córrego Grimpas. Porém, com esse projeto de fertirrigação conseguiremos dar uma destinação mais sustentável para essa água, contribuindo com a pecuária”, diz o presidente do Grupo Marajoara, André Luiz Rodrigues Junqueira.
Três bombas instaladas em tanques de água tratada que percorrerão quase um quilômetro em tubulações até chegar ao destino, onde será criado gado de corte. Em média, serão jorradas no local 75 mil m³ de água por hora. A cada 12 horas, serão um milhão de litros de água de reuso reaproveitados. O sistema será composto por cerca 600 aspersores, sendo que cada um irá lançar água a uma distância máxima de um raio de 11 metros. Isso faz com que cada gota de água seja muito bem aproveitada, evitando o desperdício.
O pasto será dividido em piquetes para se fazer o manejo rotativo e a expectativa é que a produtividade aumente em cinco vezes. “Através deste sistema, independentemente do período do ano, se de seca ou não, você terá pasto verde e abundante para gado”, explica o zootecnista da Marajoara, Diego Dantas Colnago.
Ele cita outra vantagem: por meio do sistema instalado, é possível fazer a suplementação para o pasto diluindo-o nos próprios tanques da ETE, facilitando o processo. “Com água e nutrientes necessários, o pasto ficará mais saudável, refletindo no ganho de peso do gado”, explica. O zootecnista lembra ainda que além da pastagem, o sistema de fertirrigação por meio de reuso de água pode ser perfeitamente usado em outros cultivos, como milho, sorgo e soja.
Da concepção do projeto até o início das obras para sua instalação, no fim de janeiro, foram necessários seis meses de estudos técnicos no solo da área e outros quase cinco meses para aprovação junto da Secretaria Estadual de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (Semad).
De acordo com a bióloga Daniela Souza Silva, diretora da Ecovel, empresa que assessora ambientalmente a Marajoara, o projeto também, a médio prazo, servirá como um importante mecanismo de recarga dos aquíferos locais ou lençóis freáticos.
“Com esse sistema de fertirrigação, parte da água é absorvida pela planta, no caso o capim do pasto, parte é evaporada e uma parte significativa vai para o lençol freático”, explica a consultora.
Reuso é desafio
Iniciativas como da Marajoara ganha ainda mais relevância quando estudos demonstram que o reuso de água vem se tornando cada vez mais relevante, considerando-se os cenários de aumento de demanda de água, recorrência de períodos severos de secas, escassez hídrica e contaminação dos recursos hídricos.
Mas apesar da relevância inconteste dessas boas práticas na gestão dos recursos hídricos, ainda são escassos os dados sistematizados e disponíveis sobre o cenário mundial de reuso de água. Um dos poucos estudos globais sobre o tema é um relatório de 2011 da Global Water Intelligence que destaca alguns países na prática de reuso de efluentes. Segundo o documento, o percentual de reuso em relação à produção total de efluentes domésticos é de 91% no Kwait, 85% em Israel, 35% em Singapura, 32% no Egito, 15% na Austrália, 14% nos Estados Unidos e na China, 12% na Siria, 11% na Espanha.
No Brasil, segundo o estudo da Confederação Nacional da Indústria (CNI) “O Impacto Econômico dos Investimentos de Reúso de Efluentes Tratados para o Setor Industrial”, de 2018, menos de 1% da oferta de água no país provém de reúso de efluentes tratados. Em Israel, por exemplo, 70% da oferta vem da reutilização de efluentes.
O projeto de Fertirrigação é uma continuidade de um outro projeto de sustentabilidade da empresa, que é desenvolvido há pouco mais de dois anos a partir da Estação de Tratamento de Efluentes (ETE): é o uso da biomassa extraída dos efluentes e que vira fertilizante para pequenas propriedades rurais na cidade. Rica em nutrientes, é jogada no pasto e também contribui para a eficiência da criação de gado.